29 de abril de 2008

SONHOS DE PARACELSA

Como um louco Celso se preparara para ir naquela noite para o lar de Paracelsa: saíra de uma festa comigo e com o amigo Buda, para irmos para lá juntos. Ali havia paraguaias trajadas com penas de pássaros extintos a servir frutas que ninguém sabia de onde eram.

Foi de se estranhar a vez em que perguntamos como conseguiam aquelas penas e frutas diferentes. Respondiam que as adquiriam de sonhos que outras pessoas não puderam ter. Iriam de tempos em tempos à caça de sonhos de pessoas que não conseguiam dormir. Trariam de lá gostos nunca antes provados e sensações nunca alcançadas.

Achamos se tratar de conversa de mulher e fizemos muitas brincadeiras. Buda mandou a sua paraguaia entrar no seu armário, para depois sair e dizer que havia escapado de um de seus sonhos. Depois a atacou beijando, esfregando sua barba e a mordendo. Eu mesmo me joguei debaixo da rede e encoxando-a, ralhei com Paracelsa: estou pesado, nunca mais quero sonhar com jacas! Sobre a rede, em sua pele de tapir ela me repreendeu com seu olhar.

Muitas vezes, pratiquei sexo bruto com uma delas, mas nada se comparava aos estados de consciência dos sonhos dessas índias. De primeira pensava não ser possível. Esse tipo de realidade existe? Durante várias vezes porém esas sensações se tornaram reais. Durante algum tempo já guardava o segredo e tinha medo até. Foi quando Celso me afirmou estar sentindo coisas que não imaginara poder sentir. Abrimos então o jogo e continuamos indo a Paracelsa. Se não mata, engorda.

Paracelsa mesma, por sua vez, não participava dessas caças, nem comentava nada. Deixava um tom de mistério pairando sobre a questão. Para nós era indiferente. Por que pensar nisso, uma vez que ela retinha em seu sexo uma flor-ferida sempre exposta, cujo toque metia a gente doida? Nos empapava com sua saliva quente e ficávamos dentro de uma bolha, como numa ilusão em que cada um ficava ao lado de si próprio, formando uma fileira longa de eus de mundos paralelos.

Celso Pinto, que costumava ter um sono muito tranquilo, teve na noite anterior sonhos estranhos e dormira muito mal. Desde a manhãzinha então, ficou imaginando como seria essa noite no lupanar. Depois que chegamos, escolheu a dona e ficou conversando com ela até fecharem os olhos e dormirem, quase no fim da madrugada. Antes de clarear porém, acordou com tanto tesão, que agarrando-a por trás sem avisar a dominou, em sexo fogoso e frenético, acordando a todos os outros aposentos e gerando uma corrente de anseios interminável na oca inteira. De olhos fechados todos nos entregamos aos sons de corpos se amando divinamente, em fortes tremores de gozo. Por toda a oca sentíamos o frenesi endoidecedor.

Foi quando abri os olhos. A relva quente e espessa grudava em meu corpo. Um tapir eloquente me olhava reticente, chamando-me. Olhei para a picada até ele, na beira da selva. Olhei para meus pés: detalhe, eram patas. As aves gritam, a selva balança, o caçador está perto. Vamos!, gritou a natureza. Corri instantaneamente na direção do tapir. Mas antes de chegar à mata, no fim do corredor da picada, uma flecha me atingiu. Desmaiei.

Acordei. As índias sorriam e faziam festa ao me ver anestesiado no chão da oca. Queria, mas não conseguia sentir nada. A flecha tinha sido envenenada sabiamente: "a dosagem certa faz o veneno", dizia sempre Paracelsa. Olhei ao redor. Buda e Celso também estavam presentes. Éramos tapires e seríamos oferendados à deusa, a ela: à ferida de Paracelsa.

Um comentário:

Ingrid disse...

Oi Udo,

Adorei o enredo da tua história.
Realmente nos transformamos com nossos sonhos. Viramos gnomos, anjos, flores e animais.
Gostei.

beijo...Ingrid